quarta-feira, 10 de outubro de 2018

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montagem 2 fotos
2018, josé

não sei dizer o teu nome
a minha boca encheu-se de silêncio
e só reconhece sombras
estranhos monossílabos
de uma língua morta

as palavras demoram
eternidades a chegar
mesa cama vento
são sombras do que não sei dizer

é fácil esperar-te à boca do metro
como se entre a boca do metro
e a minha boca houvesse a tua boca
e farrapos de uma escuridão
que se esconde no fundo do coração

ainda aceno
como se a minha mão fosse um relâmpago
que só tu vias nos teus olhos fechados

talvez haja sinais concretos
o armário fechado
o seu enigmático equilíbrio interior de objectos
tão imóveis como as minhas mãos
a pauta de música com pássaros desenhados
que há muito deixaram de cantar

mas perdi a capacidade de ver
a minha cabeça já só é
um animal embalsamado
num museu poeirento de história natural
onde os soalhos rangiam
como o bater dos nossos corações

tudo está agora num lugar diferente
e como escriba do deserto
deixo nas dunas de areia
sinais ilegíveis de um poema antigo

talvez o vento
calígrafo experiente
o escreva de modo diferente
e um beduíno de rosto crestado
o recite na sua voz cansada
voz de quem atravessou
todos os desertos do mundo
2018, josé

música
CHRYSTA BELL DAVID LYNCH ALL THE THINGS
https://youtu.be/cUawClYtfwg

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